A influência da psicoesfera das notícias (parcialmente) falsas

De acordo com Milton Santos, “a tecnoesfera é o resultado da crescente artificialização do meio ambiente”, e que a substituição da esfera natural vem acontecendo por uma esfera técnica, seja na cidade, como no campo. O planeta está plenamente recoberto por uma tecnoesfera com o advento da informática e, consequentemente, da cybercultura. E esta prática uniformiza as práticas, os modos, as modas, estilos no mundo, ou seja, uma homogeneização das culturas. Não que não hajam resistências, as quais Milton Santos as nomeia como rugosidades, mas, de modo geral, esta globalização acontece em todo o mundo. Estamos em lugares diferentes, mas ao mesmo tempo, em lugares comuns. Porém é comandada por uma psicoesfera.

“A psicoesfera é o resultado de crenças, desejos, vontades e hábitos que inspiram comportamentos filosóficos e práticos, as relações interpessoais e a comunhão com o Universo”. De acordo com o autor, começamos a gostar de um determinado conjunto de coisas, porque, de alguma forma, é atribuído valor a ele. E valores estão regendo as práticas cotidianas e dificilmente são questionadas ou pensadas. A pesquisadora e também geógrafa Maria Adélia Aparecida de Souza diz que a psicoesfera é a configuração das mentes que agita o movimento novo, provocado pela tecnoesfera. O marketing é uma psicoesfera, por exemplo, por meio da propaganda, que configura a cabeça das pessoas para o consumo desenfreado.

Pensando nisso, associo a essa questão a divulgação maciça de informações falsas – ou parcialmente falsas, como vimos em uma postagem anterior. Essa divulgação exagerada em diversos meios, de forma rápida, contínua e repetitiva, sem compromisso com a realidade e sem consistência pretende algo que o marketing pretende: configurar a cabeça das pessoas, de modo que elas ajam de acordo com o que planejam. Por meio dessas redes, pessoas são coagidas – pesada a palavra, talvez não seja essa – a repassarem essas informações pelas redes sociais. Entretanto, há uma resistência a essa prática, como uma tentativa de se configurar uma outra nova psicoesfera de resistência a esta psicoesfera vigente.

E a concretização dessa luta de psicoesferas se encontra nas redes sociais, concretizadas na tecnoesfera, diariamente. Sites de confirmação de informação, até pouco tempo atrás, não tinham visibilidade e geralmente eram compostas por mídias que não recebiam credibilidade, visto que a grande mídia não costumava ser questionada (como é hoje). Atualmente, agências de fact checking são constituídas pelas grandes mídias, bem como por mídias alternativas. O Conselho Nacional de Justiça, por exemplo, em março de 2018, após o assassinato da vereadora Marielle Franco e a chuva de publicações caluniosas contra ela, publicou em sua página no Facebook orientações de checagem de informações, com a finalidade de se evitar a propagação de boatos.

Campanha do CNJ Foto: Reprodução/CNJ

E, por estarmos submersos nessas práticas, não há como prever qual delas prevalecerá, nem quando isso ocorrerá. Mas interessa-me como elas estão se constituindo e, como se verifica, esta tecnoesfera ultrapassa fronteiras e atinge escalas globais.

Fontes consultadas:

CNJ dá dicas para não cair em ‘fake news’. O Globo.https://oglobo.globo.com/rio/cnj-da-dicas-para-nao-cair-em-fake-news-22518409. Acesso em 11 de junho de 2019.

SANTOS, Milton. Técnica, Espaço, Tempo. 5 ed. São Paulo: Edusp, 2008.

SOUZA, Maria Adélia Aparecida. A tecnoesfera e a psicoesfera “do Bem”. Conceitos em Ação.  https://www.youtube.com/watch?v=hCxJIy1TTCo. Acesso em 11 de junho de 2019.